Dupes na Cosmética: Entre a Inspiração e a Ilegalidade – Como Diferenciar, Quais os Riscos e Como Atuar em Conformidade
- ABC
- 4 de dez.
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O mercado cosmético evolui em ritmo acelerado, impulsionado tanto pela inovação quanto pela crescente democratização do acesso a produtos de alta performance. Nesse contexto, surge um fenômeno cada vez mais presente entre consumidores e fabricantes: os chamados dupes. Embora populares, esses produtos geram dúvidas importantes sobre sua legalidade e sobre a linha tênue que os separa das falsificações. Compreender essa diferença é essencial para garantir práticas de mercado responsáveis, seguras e juridicamente adequadas.
Dupe x Falsificação: Entendendo a Diferença
Para esclarecer o tema, é fundamental delimitar os conceitos.
Dupe, abreviação de duplicate, refere-se a produtos inspirados ou semelhantes a itens de marcas famosas, de luxo ou com preços mais elevados. Embora se baseiem no resultado, cor, textura, acabamento, aroma ou performance do produto de referência, os dupes são comercializados com identidade própria: marca distinta, embalagem própria e canais independentes. A proposta é oferecer ao consumidor uma alternativa mais acessível, sem a intenção de reproduzir fielmente o original ou induzir o público ao erro.
Já a falsificação tem como propósito copiar integralmente o produto original, incluindo marca, logotipo, design, embalagem e outros elementos visuais protegidos. Trata-se de uma prática deliberada de enganar o consumidor quanto à procedência, qualidade e autenticidade. Além de configurar crime, a falsificação viola diretamente a legislação brasileira, especialmente a Lei de Propriedade Industrial (Lei nº 9.279/96) e o Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90).
Assim, a distinção central entre um dupe e uma falsificação está na legalidade e na transparência. Enquanto o dupe se apresenta como alternativa legítima, a falsificação se apoia na fraude e no prejuízo às marcas e ao consumidor.
Quando um Dupe se Torna Ilegal?
Apesar de serem produtos legítimos, os dupes podem ultrapassar o limite da inspiração e tornar-se ilícitos. Isso ocorre quando:
• geram confusão no consumidor;
• usam elementos visuais similares a ponto de sugerir associação indevida;
• violam direitos de propriedade intelectual, como patentes, desenhos industriais, marcas registradas, trade dress e práticas de concorrência desleal.
Portanto, mesmo que um dupe não utilize a marca original, a reprodução de uma fórmula patenteada ou de um design protegido já configura violação. A ilegalidade não está apenas no uso de sinais distintivos, mas na apropriação de qualquer ativo resguardado pela legislação.
Riscos para Empresas que Produzem ou Comercializam Dupes
Embora não seja proibido fabricar ou vender dupes, há riscos relevantes para as empresas que atuam nesse segmento.
A principal precaução é distanciar-se claramente dos elementos protegidos do produto que inspira o dupe. Isso inclui fórmulas inéditas, embalagens registradas, nomes, desenhos industriais e outros aspectos que possam estar protegidos.
No Brasil, o tema já chegou aos tribunais. Um exemplo de grande repercussão envolveu a empresa suíça Chanel SARL, que ajuizou ação contra a brasileira Fator 5 Contratipos Ltda., fabricante de perfumes contratipos (processo nº 9181665-20.2005.8.26.0000). A decisão de primeira instância proibiu o uso de qualquer menção às marcas originais. No entanto, o Tribunal de Justiça de São Paulo reformou a sentença, entendendo que:
• não havia risco de confusão devido às embalagens distintas;
• as marcas de referência eram citadas apenas como indicação olfativa para o consumidor;
• a diferença de preço e público consumidor era significativa.
Esse caso demonstra como a análise é complexa e depende do contexto. Ainda assim, quando a Justiça identifica violação, a empresa pode enfrentar sanções cíveis e, em alguns casos, criminais, com base em dispositivos da Lei de Propriedade Industrial, do Código Penal e do Código de Defesa do Consumidor. Além disso, há riscos reputacionais importantes, especialmente em um setor em que confiança e credibilidade são essenciais.
Assim, ainda que nem todo dupe seja ilegal, a linha entre a inspiração legítima e a infração é bastante tênue — exigindo atenção contínua e adequada orientação jurídica.
Como Garantir Conformidade Legal ao Produzir um Dupe
Para minimizar riscos e assegurar conformidade, alguns cuidados são essenciais:
1. Evitar qualquer elemento que gere confusão
Isso inclui logotipos, fontes, combinação cores, formatos, embalagens ou nomes que remetam ao produto original.
2. Realizar análise jurídica preventiva
A análise preventiva realizada por especialistas em propriedade intelectual é indispensável. Ela permite identificar riscos relacionados a marcas registradas, desenhos industriais, patentes e outros direitos protegidos, orientando ajustes necessários ainda nas etapas iniciais, quando mudanças são menos onerosas e mais eficientes.
3. Observância rigorosa às proteções legais existentes
Inspiração não pode ser confundida com reprodução de ativos protegidos. Fórmulas patenteadas, designs registrados, elementos de trade dress ou quaisquer criações intelectuais resguardadas pela lei não podem ser replicados. Garantir que o dupe não invada áreas protegidas reduz a possibilidade de litígios.
4. Investir na proteção dos próprios ativos
Registrar marcas, embalagens, composições originais e desenhos industriais fortalece o posicionamento da empresa e cria uma camada de segurança jurídica. Além de evitar conflitos futuros, esse investimento demonstra seriedade, transparência e compromisso com a inovação.
5. Assegurar comunicação clara com o consumidor
A forma como o produto é apresentado ao mercado também influencia na percepção de legitimidade. Mensagens, descrições e campanhas devem deixar claro que se trata de um produto próprio, sem qualquer tentativa de se passar pelo original. A transparência é elemento central para diferenciar dupes legítimos de falsificações.
Seguindo esses princípios, é possível lançar produtos competitivos, seguros e alinhados ao ordenamento jurídico, construindo marcas respeitadas e confiáveis.
Nicole Magalhães
Marinello Advogados
ABC - Associação Brasileira de Cosmetologia

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